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Sereis minhas testemunhas

Artigo do Diác. Valmir Rodrigues Pereira

A Igreja em sua sabedoria histórica, nos proporciona refletir e vivenciar conteúdos de grande relevância para a nossa vida de fé pessoal e comunitária. Por isso, destacam-se alguns meses de cada ano para enfatizar algumas características da fé cristã: maio (Maria), agosto (Vocação), setembro (Bíblia). Entre eles, o mês de outubro é dedicado às Santas Missões. Ou seja, para enaltecer a importância da ação cristã nas realidades diversas em que nos encontramos.

Missionário é todo aquele que recebeu uma importante incumbência, ou um mandato, para realização de alguma atividade, sendo ela de curto ou longo prazo. No caso da missão da Igreja, é contínuo, pois, todo cristão, a partir do seu batismo, recebe, por graça, o ministério de ser porta voz da mensagem salvífica a todas as pessoas ou por onde se encontrar. Pelo batismo, somos inseridos na família cristã, que é a Igreja de Cristo, comunidade de amor que é constituída de diversos membros, com funções também diferentes, porém todos a serviço uns dos outros com o objetivo de proporcionar a experiência da salvação de modo universal (cf. Rm 12, 4-8; 1Cor 12, 12-31; Ef 4, 11-16).

Nesse sentido, a Igreja católica é compreendida como “Sacramento universal de Salvação” (LG, nº 48). Em si mesma, e por meio de seus membros, torna-se sinal visível e eficaz da graça redentora a todos os povos, independente de quem seja ou de suas circunstâncias. Mas para tal feito, é preciso que todo cristão/batizado reconheça e cresça em consciência de que a missão de Cristo agora também é sua, ou seja, a missão do Senhor é a missão da Igreja, povo de Deus. Cada um, a seu modo, poderá contribuir com a missionariedade da Igreja (cf. LG, nº 33).

A partir disso, é fundamental todos os cristãos manterem-se unidos como verdadeiro corpo evangelizador, para que a propagação do Evangelho tenha sua plena eficácia no que diz respeito à unidade dos cristãos (UR, nº 2. 4). A unidade como princípio faz com que os trabalhos missionários tenham objetivo único, que é apresentar a todos o Cristo sofredor e glorioso, de tal modo que ultrapasse qualquer dimensão impositiva, de proselitismo. A missão, sendo de caráter universal, não pode ser e estar restrita a um único grupo de pessoas. Toda ação missionária precisa ser além fronteiras. Assim, imbuídos do conteúdo salvífico, que é Cristo Jesus, nos direcionamos aos irmãos que ainda não o conhecem ou que talvez não se despertaram para com sua beleza gratuita. A Palavra-Evangelho não está aprisionada em sistemas e estruturas enrijecidas, e não pode, pois, em si mesma é dinâmica (2 Tm 2,9c) – saindo da boca do profeta, não volta sem realizar sua missão a qual se destina, por obra de Deus (Is 55,11).

Não basta tão somente conhecer. É preciso, como resultado, praticar esta mesma Palavra: “Sede praticantes da Palavra, e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos” (Tg 2,22). Não nos compete apenas ouvir, requer produzir frutos, e fortificados por Ela semeamo-la à corações dispersos por todo o mundo (Mt 13,3-9; cf. Mc 4,26-29). Caindo em terra boa, produzirá frutos em abundância. Além disso, todos os talentos que o Senhor nos concedeu precisam ser multiplicados, e não enterrados em decorrência dos nossos medos ou fragilidades humanas (Mt 25,14-30).

Os talentos advindos da experiência com o Ressuscitado, de sua escola de discípulos missionários, se multiplica a cada abertura para com o novo e para com aqueles que se nos apresentam diferentes na forma de pensar e agir. É por meio desta experiência que continuaremos colocando em prática o “Ide” de Jesus aos seus discípulos: “Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). A totalidade do Evangelho é para a totalidade do povo de Deus que não está apenas no Cristianismo Católico. Todavia, o Evangelho será universalizado quando os ‘escolhidos’ tomarem consciência e se prontificarem, na ação do Espírito Santo, ao primeiro anúncio (Querigma) (cf. CIC, 852).

Com isso, os Atos dos Apóstolos continua a ser escrito por cada pessoa que assume sua missão na Igreja. Por todos aqueles que, na audácia da fé, se colocam como testemunhas. Primeiro enviou os doze, depois setenta e dois (Lc 10,1ss) e a cada dia envia operários para a Messe (Mt 10,1-23; Mc 6,7-13; Lc 9,1-6). Nesse sentido, vale ressaltar que a missão não é responsabilidade unicamente dos Pastores – padres e bispos, mas é de todo o povo eleito de Deus. Com isso enfatizamos que: “[…] a Igreja toda é missionária por sua natureza e que a obra de evangelização é dever fundamental do povo de Deus, todos os fiéis conscientes da própria responsabilidade assumam cada um sua parte na obra missionária” (CDC, c.781).

Então, como ser missionário? A missão podendo acontecer dentro e fora do cristianismo católico, seu início pode estar no assumir as pastorais e movimentos de nossas comunidades, na participação ativa e consciente da liturgia, na formação espiritual e catequética dos membros das diversas pastorais; na propagação da fé àquelas pessoas afastadas ou excluídas da comunidade; acolhimento de pessoas abandonadas, no cuidado com jovens, adolescentes, crianças e idosos; até mesmo no cuidado para com a casa comum, além da constituição de uma equipe específica que fomente as atividades missionárias em diversas realidades da comunidade. É a partir disso que seremos “sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 13,13-14). Não para destruir, causar desuniões ou conquistar territórios e adeptos, mas para edificar, unir e reintegrar à vida digna em Cristo Jesus! Para tanto, será oportuno deixar-se interpelar pela Alegria do Evangelho. Alegria esta que nos renova a partir de dentro (cf. EG, nº 2-7)!

Por isso que na ação missionária não podemos apresentar aos outros um falso evangelho, nossas ideias ou ideologias, nossas adesões pessoais ou pretensões de mundo. A verdadeira missão desenvolve-se em boas obras a partir do momento que nos deixamos conduzir pelo Espírito da Verdade, de tal modo que sendo instrumentos seus, mesmo que insuficientes, a Boa Nova chegue à muitos corações.

A Igreja é missão (AG, nº 2), sua essência é ser missionária à modelo do Cristo bom Pastor: que cuida das feridas, resgata as ovelhas dispersas, instrui as que vivem na ignorância, liberta as que se encontram em situações de escravidões (cf. Lc 4, 18-19). Ao mesmo tempo que somos chamados a sair de nós mesmos ao encontro do outro, se faz necessário também deixar-se encontrar na caminhada. Ou seja, do mesmo modo que somos instrumentos de salvação, por outro lado necessitamos também de sermos salvos. É a perfeita espiritualidade da comunhão e da participação! – (Ninguém é tão pobre que nada possa oferecer, e ninguém é tão rico que nada possa receber!).

É com esta esperança que somos exortados a uma mudança radical de mentalidade e de estruturas: aperfeiçoar o que ainda é possível de ser utilizado na ação evangelizadora e assumir novas posturas, meios e métodos diante daquilo que não mais corresponde com as exigências do tempo atual – o tempo e as experiências nos provocam a transformações. “Viver e atuar neste mundo globalizado implica mudança de mentalidade e de estruturas” (Doc. da CNBB, nº 105, p. 52). Fato é que só haverá mudanças de estruturas se houver primeiro uma transformação da mentalidade. Para que isso ocorra requer a superação de premissas, como: “foi sempre assim” ou “estou (estamos) aqui desde…”. É a conversão pastoral que urge em nossas comunidades de pequeno, médio e grande porte (cf. DAp, nº 366. 370), nas realidades rurais e urbanas!

Assim como o Filho foi enviado pelo Pai, este mesmo Filho, em autoridade divina, enviou os discípulos e continua a fazê-lo conosco (Jo 20, 21b). Para onde nos envia? Além das realidades já mencionadas, Ele nos envia para as periferias geográficas e existenciais; para as escolas, às universidades (cf. EG, nº 132-134), às famílias em suas diversas condições, aos presídios, aos hospitais, aos asilos, aos internatos, à moradores de rua, aos que perderam o sentido de viver, enfim. Evangeliza-se a partir do contato interpessoal e pelas novas mídias sociais (cf. Doc. da CNBB, nº 109, p. 86-89).

Viver a missão encarnada não implica exclusão das redes sociais, pois seu alcance também é universal, apesar de suas limitações técnicas e de recursos – “A mídia não é um mero instrumento neutro” (Estudos da CNBB, nº 101, p. 20). Ao mesmo tempo, porém, que não seja pretexto para nos esquivarmos de um contato direto com aqueles que são nossos Próximos (Lc 10, 29b). As tecnologias criam motivações, os contatos pessoais geram vidas! Este último retira do isolamento, do individualismo e do sectarismo (grupismos). Faz superar as intolerâncias e os indiferentismos. A missão alarga os horizontes de uma vida partilhada! “[…] a comunicação mais importante é a humana” (TULLIUS, 2021, p. 31).

Em suma, é no Coração da Igreja que haveremos de reconhecer a nossa vocação e missão (Sª Teresinha). Na Igreja e pela Igreja nos fazemos igreja em missão no mundo, pois “Cristo Jesus, [é a] nossa esperança” (1Tm 1, 1b) – “Esperançar é a missão de todo cristão” (Ibid., p. 15).

REFERÊNCIAS
BÍBLIA SAGRADA. 2ª ed. Brasília: CNBB, 2019.
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. São Paulo: Loyola, 2000. (Par. 849-852).
CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO. São Paulo: Loyola, 2017. (Cc. 781-792).
COMPÊNDIO DO VATICANO II. Constituições, Decretos, Declarações. 30ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1968.
CONFERÊNCIA NACINAL DOS BISPOS DOS BRASIL. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2019-2023. Brasília: CNBB, 2019. (Doc. da CNBB, 109).
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. A Comunicação na vida e na missão da Igreja. 2ª ed. Brasília: CNBB, 2012 (Estudos da CNBB, 101).
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade: sal da terra e luz do mundo (Mt 5, 13-14). Brasília: CNBB, 2016. (Doc. da CNBB, 105).
CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AMERICANO. Documento de Aparecida. Brasília: CNBB (et al), 2012.
FRANSCISCO, Papa. Evangelii Gaudium. Exortação apostólica. São Paulo: Loyola, 2013. TULLIUS, Marcus. Esperança: a missão do agente da pastoral da comunicação. São Paulo: Paulus, 2021.

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