Côn. Manuel Quitério de Azevedo
O Catecismo da Igreja Católica ao se pronunciar sobre o momento litúrgico da Quaresma, à luz da Páscoa, o vê como um reler e reviver os grandes acontecimentos da história da salvação no “hoje” de sua liturgia (1095). Ao celebrar o ciclo anual dos mistérios de Cristo, a santa Igreja venera com particular amor a bem-aventurada mãe de Deus, Maria, que por um vínculo indissolúvel está unida à obra salvífica de seu Filho; em Maria a Igreja admira e exalta o mais excelente fruto da redenção e a contempla com alegria como puríssima imagem do que ela própria anseia e espera em sua totalidade (SC 103; CIC 1172). Assim, em todo o tempo litúrgico da Igreja, Maria nunca está ausente. Vislumbrando um texto publicado pela comunidade Shalom, somos agraciados de belíssimas presenças de Maria. A vida da Virgem Santíssima, foi em tudo fazer a vontade de Deus e sua participação na Quaresma pode ser compreendida sob outra ótica: ensinar-nos a viver o tempo quaresmal, rumo à Páscoa. No plano salvífico de Deus (Lc 2,34-35) estão associados Cristo crucificado e a Virgem dolorosa. Como Cristo é o “homem de dores” (Is 53,3), por meio do qual se agradou a Deus em “reconciliar consigo todos os seres, os do céu e os da terra, fazendo a paz pelo sangue de sua cruz” (Col 1,20), assim Maria é a “mulher da dor”, que Deus quis associar a Seu Filho, como mãe e partícipe da Paixão. Dos dias da infância de Cristo, toda a vida da Virgem, participando do rechaço de que era objeto do Filho, transcorreu sob o sinal da espada (Lc 2,35). Da Quaresma à Páscoa é tempo oportuno para crescer em nosso amor filial àquela que ao pé da Cruz entregou a seu Filho, e se entregou Ela mesma com Ele, por nossa salvação. Este amor filial podemos expressar durante a Quaresma impulsionando certas devoções marianas próprias deste tempo: “As sete dores de Santa Maria Virgem”; a devoção a “Nossa Senhora, a Virgem das Dores”, cuja memória litúrgica se pode celebrar na sexta-feira da V semana de Quaresma; e a reza do Santo Rosário, especialmente os mistérios de dor.
São João Paulo II como seu olhar atento para o tempo quaresmal, rumo à luz da Páscoa nos alerta para três princípios, nos quais Maria não se esquivou: Afastamento: Quando se afasta de Deus, esquece-se dos bens e talentos que Ele dá a cada pessoa. O pecado faz com que se esqueça dos bens mais preciosos que se possui. O processo: O processo de conversão começa quando se percebe, após o afastamento, tudo o que se perdeu. Neste processo, é preciso o amadurecimento para que haja a volta. Precisa-se ter a certeza de que Deus é bom e misericordioso e não deixar a vergonha do retorno ser maior. O retorno: Após a decisão e o amadurecimento, acontece o retorno. E quando se volta aos braços do Pai, encontra-se a misericórdia, que acolhe independente da circunstância. Assim como na Parábola do Filho Pródigo, é preciso que saibamos retornar à Casa do Pai. A Quaresma, rumo à Páscoa é um chamado profundo para a nossa conversão! Deixe esse tempo tocar seu coração, como nos diz o Catecismo da Igreja Católica (1244). Rita de Sá Freire, reforça o que expomos: “Procure viver a quaresma acompanhados por Maria Santíssima. A vivência da quaresma em Sua companhia materna nos auxiliará a participar mais frutuosamente do mistério da Páscoa, que é o mistério central da nossa fé: Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Muito embora a figura de Maria apareça de forma discreta e silenciosa, por meio de Seu exemplo, podemos notar, imediatamente em Maria, as três virtudes essenciais que estão diretamente ligadas às práticas da quaresma: a) Silêncio, escutar e colocar em prática a Palavra de DEUS; b) Caridade ou solidariedade, Maria Santíssima parte apressadamente a caminho da casa de Isabel para ajudá-la; c) Penitência, participou do rito de Purificação, mesmo estando desobrigada. Neste esforço os cristãos crescem em santidade, vencendo o pecado, elevando seus olhos a Maria (LG 65) e nela ver a Igreja Santa do Senhor (CIC 829). Diante destas recomendações vemos o que a Igreja nos convida, a dedicar-nos a oração e penitência. Contemplando um texto dos Templários de Maria vemos: Nossa Senhora tinha uma fé tão profunda que a levou a cooperar e crer no incrível da morte de seu Filho viria a vitória definitiva. Cada vez que assistirmos à Missa nesta Quaresma, recordemos a importância de compreender que a Santíssima Virgem está junto a cada altar, do mesmo modo que esteve no Calvário. Sua união com Jesus na nossa salvação faz com que Maria seja modelo da Igreja (CIC 721), como Ela o ofereceu por primeira vez no altar da Cruz com sua fé, vida, Mãe de Cristo e da Igreja (CIC 963-975). No formulário da Missa proposta pela Igreja para a comemoração de Maria junto á Cruz do Senhor, encontramos uma afirmação forte de São Paulo: “Deus não perdoou a seu próprio Filho”, entregando-o para morrer por nossa salvação e ressuscitar para interceder pelos homens junto ao Pai (Rm 8,31b-39). Em função disso, São Paulo afirma a fortaleza e intrepidez que deve ter um cristão por confiar no seu único Redentor. Esta foi a confiança da “primeira discípula” (CIC 963), da cristã por excelência! Nunca se ouviu dizer nos Evangelhos, que em algum momento Maria teve medo (CIC 461-469). Quem a poderia separar de seu Filho? Aflição, angústia, perseguição? (Rm 8,35). Para Ela nem morte nem vida, nenhuma força vinda da terra ou dos infernos poderia separá-la do amor a Jesus. Essa é a Maria, a Mãe de Deus e Nossa, que conhecemos e veneramos na Igreja, Una, Santa, Católica e Apostólica (CIC 823-829). O Papa Francisco nos diz: Só com um olhar cujo horizonte esteja transformado pela caridade, levando-nos a perceber a dignidade do outro, é que os pobres são reconhecidos e apreciados na sua dignidade imensa, respeitados no seu estilo próprio e cultura e, por conseguinte, verdadeiramente integrados na sociedade” (Fratelli Tutti, 187). Eis o tempo para crer, esperar e amar. Que este apelo a viver a Quaresma como percurso de conversão, oração e partilha dos nossos bens nos ajude a repassar, na nossa memória comunitária e pessoal, a fé que vem de Cristo vivo, por meio de Maria Santíssima, a esperança animada pelo sopro do Espírito e o amor cuja fonte inexaurível é o coração misericordioso do Pai. Que Maria, mãe do Salvador, fiel aos pés da cruz e no coração da Igreja, ampare-nos com a sua solícita presença, e a bênção do Ressuscitado nos acompanhe no caminho rumo à luz pascal. “Que a Virgem Maria nos ajude a manter desperto o nosso coração para acolher este tempo de graça que Deus nos oferece”. (Mensagem da Quaresma de 2022). Que o Espírito Santo nos anime nesta Quaresma na subida, rumo à Páscoa, com Jesus, para fazermos experiência do seu esplendor divino e assim, fortalecidos na fé, prosseguirmos o caminho com Ele, glória do seu povo e luz das nações. Que Maria esteja sempre conosco. Bento XVI conclui. Que a Cruz da Ressurreição, no qual o Amor de Deus redimiu o mundo, ilumine a história. Senhora da Dores e da Luz, Rogai por nós.
Bibliografia:
Compêndio Catecismo da Igreja Católica
Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium – sobre a Sagrada Liturgia
Constituição Dogmática Lumen Gentium – sobre a Igreja Papa Paulo VI, de 21 de novembro de 1964.
De Sá Freire, Rita: Mensagem de Nossa Senhora de Fátima: O Plano
Encíclica Fratelli Tutti
São João Paulo II. Divino de Paz e Salvação – Editora Petrus São Paulo- 2011